quinta-feira, 24 de outubro de 2013

O Capitalismo Frankenstein





Quem acredita que a civilização contemporânea, capitalista, já produziu tudo que podia em horrores, atrocidades, violências e absurdos, que fique atento ao significado histórico do controle da produção de alimentos pelas grandes multinacionais do setor de transgênicos. A agricultura, que modificou por completo a existência do homem ainda na pré-história, é agora, ela própria, radicalmente modificada, para atender às demandas dos mercados e das grandes corporações. Passados mais de dez mil anos, o agricultor, vem agora, perdendo um dos mais genuínos direitos, responsável, inclusive, pela perpetuação da vida, qual seja, armazenar as sementes da colheita para o próximo plantio. Como se não bastasse arrancar do homem a terra, arrancam-lhe também o acesso à semente. As plantas geneticamente modificadas, ao contrário do que sempre se propagandeou, a cada dia tornam-se dependentes de uma quantidade cada vez maior de venenos e agrotóxicos, dado o aumento da resistência das pragas em relação a eles, tornando nossa alimentação arriscada e perigosa. As empresas lucram em dobro, com a venda das sementes e dos venenos. Se quisermos considerar ainda, uma história de mais longa duração, podemos dizer que a constituição e formação da vida na forma como conhecemos, com uma quase infinita variedade de espécies, é resultado de um processo de milhões de anos, onde a seleção natural e demandas adaptativas deram as caras e as cores do mundo em que vivemos. Alterar a estrutura genética de seres vivos e criar novas espécies em laboratórios significa interromper um fluxo natural de energia que vem se processando desde os tempos mais remotos. Não é possível dimensionar quais seriam os desdobramentos desta prática no longo prazo. O que já sabemos é que em lugares do mundo onde o cultivo de transgênicos já se proliferou, o número de crianças com deformações e a incidência de doenças, como o câncer, vem aumentando assustadoramente. Estará a vida, outra vez imitando a arte, a ficção, quando, sabe-se lá, não teremos em um futuro bem próximo, o capitalismo mais selvagem, revelando sua face Frankenstein?



Marcos Vinícius.

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Tarifa Zero.





O Estado brasileiro arrecada muito, mas gasta mal. A cultura da corrupção é algo tão arraigado em nosso país, que se tivéssemos como listar todos os corruptos e corruptores que por aqui já passaram, creio que teríamos uma lista quilométrica. Os valores dos prejuízos, advindos dos desvios são medidos em trilhões de reais, assim como também o são o valor dos calotes que as grandes empresas e os grandes capitalistas sonegam aos cofres públicos. A sensação é que há muito dinheiro, mas todo ele é dedicado à farra das nossas autoridades, sem qualquer contrapartida para o contribuinte, que se estrangula, dia após dia, para pagar uma infinidade de impostos e tarifas que lhe são cobradas.


O Estado brasileiro, desde a sua origem, sempre foi um instrumento que as elites utilizaram não apenas como um meio de extorquir e usurpar a população, mas para mantê-la sob completa submissão e controle. Enquanto convivemos com um modelo de educação e saúde extremamente precarizados, chuvas de bombas de gás lacrimogênio, cada uma delas custando praticamente o preço de um computador, são despejadas de helicópteros sobre a população, quando resolvem sair às ruas. O sistema fiscal e o sistema repressor, que atuam com elevadíssimo grau de sofisticação, parecem ser um dos poucos setores bem aparelhados do nosso modelo estatal, sistemas estes, diga-se de passagem, que beneficiam os ricos e penalizam as pobres, que são os que, de fato, pagam impostos e as grandes vítimas da violência policial.

É o momento de invertermos prioridades. Tem início em Belo Horizonte, o movimento pela tarifa zero, “TARIFA ZERO É MAIS”. São necessárias 95 mil assinaturas para o encaminhamento de um PROJETO DE LEI, de iniciativa POPULAR, para tramitação na CÂMARA DOS VEREADORES, que garante transporte sem tarifa e de qualidade para a população. O transporte público deve ser público de fato. A gestão da saúde, educação e do transporte público DEFINITIVAMENTE não devem adotar o modelo dos grandes negócios, pois fazem parte do kit básico, mínimo, dos direitos do cidadão. Não podemos permitir que permaneça como mercadoria, fonte de gordos lucros e espúrios negócios, o nosso sagrado direito de ir e vir.

Não é de hoje que avenidas são feitas e refeitas na cidade, obras são executadas e imediatamente destruídas, comprovadas sua inutilidade. Uma verdadeira indústria de viadutos se edificou em Belo Horizonte, que talvez, mereça o título de capital mundial dos viadutos. Alguém conhece alguma outra cidade onde se constroem tantos viadutos? E, no entanto, o trânsito continua parado, caótico, consumindo horas e horas de quem tem que se deslocar de um ponto a outro da cidade. Há quanto tempo é assim? Dentro do modelo atual há alguma perspectiva de se reverter este quadro? Não. As catracas são o grande símbolo da imobilidade de nossas cidades. Elas negam ao pobre, às classe populares, o direito de deslocarem-se livremente no espaço urbano. Além do mais, o preço das passagens é tão abusivo e a qualidade dos ônibus tão ruim, que o cidadão, muitas das vezes, se vê impelido a abandonar o transporte coletivo e fazer largo uso de seu automóvel particular, entupindo ainda mais as ruas e estrangulando de vez o trânsito já caduco. Não basta alargar avenidas, levantar e destruir viadutos, é necessário eliminar as catracas para se garantir um mínimo de mobilidade. Pelo direito à cidade, pelo direito de ir e vir, pela mobilidade urbana, por um mundo sem catracas, “TARIFA ZERO É MAIS”.



Marcos Vinícius.



Até entendo que um setor da classe médica brasileira, elitista, os grandes hospitais e as corporações ligadas à indústria da saúde posicionem-se contra a vinda de médicos cubanos para o país, pois esta política poderá afetar seus interesses corporativos e seus polpudos lucros e negócios. Principalmente, considerando-se que além dos serviços a serem prestados, eles trazem também uma nova concepção de saúde pública, onde o direito à vida sobrepõe-se à lógica perversa do capital. Já causa-me indignação e estranheza ver os pobres mortais das classes populares, historicamente oprimidos e excluídos do acesso aos mais elementares cuidados médico-hospitalares, fazerem coro a uma ideologia, que em última instância, condena-os ao sofrimento e à morte.



Marcos Vinícius.

Leitura Obrigatória: Holocausto Brasileiro, de Daniela Arbex



Por ter passado minha infância na então pacata cidade de Santos Dumont, por inúmeras vezes, ouvia as histórias que caracterizavam a vizinha cidade de Barbacena como a terra dos loucos. Esta imagem sempre esteve acompanhada das lembranças que temos de lá. Estas recordações são rodeadas de uma aura de mistérios. Quem seriam estes loucos? De onde vieram? Por que e como haviam chegado a este grau de loucura? Quais seriam os limites da loucura que levariam homens, mulheres e crianças ao encarceramento, em muitos dos casos, para o resto de suas vidas? Creio que estas questões façam parte do imaginário de muitos que por aquelas bandas viveram. Muitas destas questões foram contempladas no excelente trabalho jornalístico realizado por Daniela Arbex, em seu emocionante livro HOLOCAUSTO BRASILEIRO – GENOCÍDIO: 60 MIL MORTOS NO MAIOR HOSPÍCIO DO BRASIL, recém-lançado, pela editora Geração. Comprei-o assim que vi uma nota no Jornal. O trabalho é impressionante e revelador. Além de muito bem ilustrado, com imagens que nos cortam a alma, a história que vai se mostrando à nossa frente é algo que nem a mais criativa das imaginações teria como conceber. No terreno que fora confiscado, do delator da Inconfidência Mineira, Joaquim Silvério dos Reis, foi construído, no inicio do século XX, o Hospital Colônia. Para lá, durante décadas, milhares indivíduos, de várias partes do Brasil, eram levados, nos chamados “trens de doidos”, expressão imortalizada por João Guimarães Rosa em um de seus contos, muitas das vezes, por motivos fúteis. Era um gigantesco depósito humano, um enorme campo de concentração, onde, indesejáveis de toda ordem, sem diagnóstico de doença mental, “epiléticos, alcóolatras, homossexuais, prostitutas, meninas grávidas pelos patrões, mulheres confinadas pelo marido, moças que haviam perdido a virgindade antes do casamento” eram confinados e tinham o destino selado. Aquilo não era um centro de tratamento, mas um centro de contenção e extermínio. Segundo a autora, havia períodos, em que era registrada, uma média, de 17 mortos por dia, vítimas das mais variadas formas de violência que se possa conceber, como a fome, a exposição ao frio intenso da região, o descaso, negligência, torturas, lobotomias e eletrochoques. Havia dias em que era tão grande a descarga elétrica nos eletrochoques que a cidade ficava sem luz. Entre os anos de 1930 e 1980, teriam sido cerca de sessenta mil mortos. O livro nos permite perceber que expressões como “campos de concentração” e “genocídio” fazem parte de uma história muito próxima e recente, que muitos de nós, testemunhamos e não percebemos. Leitura obrigatória.



Marcos Vinícius.