Quando, após dobrar uma curva,
deparei -me com esta paisagem, não
pensei duas vezes, saquei o telefone do bolso e, de imediato, tirei a
fotografia. Assim que disparei o clique, de dentro do casebre, saiu um senhor,
de chapéu de palha, chinelos remendados, uma indumentária esfarrapada e cara de
poucos amigos. Encarou-me com o semblante duro, fechado, e com um olhar de
pedra. Não respondeu aos meus insistentes cumprimentos, passou sem alterar a
expressão, não olhou para trás e logo, desapareceu no caminho. Por um bom
tempo, a imagem da fotografia fixou-se também em meus pensamentos e por várias
vezes, coloquei-me a contemplá-la detalhadamente. Mas afinal, o que encontrei de tão curioso e
familiar nesta paisagem? Diante de tantos cenários e visões, por que esta impressionou-me e apenas ela, inspirou-me
a fotografia? Pensando no assunto, que agarrou-me aos calcanhares, descubro
que, hoje, esta imagem é praticamente um retrato em metáfora de mim mesmo.
Solitário no meio da paisagem, mantenho-me de pé, observando o tempo e os
escombros que despencam pelo meu interior. O telhado mantém plenamente aberto o
abrigo que as portas e as janelas há muito tempo trancaram. As cercas não
guardam territórios e já não há proteção ou marcos de propriedade. Ao fundo, o
lago vazio e o leito seco, são áreas de pastagens. A terra à frente é vermelha.
O dia, porém, é luminoso e o ar é leve. As nuvens carregadas são promessas de
chuva e vida, quem sabe um dia, a ponto de transbordar o lago. Por trás da
fotografia, os pássaros fazem acrobacias no céu e enchem o mundo com o seu
canto efusivo e arrebatador, as flores das redondezas são espetáculos de cores
e exuberâncias. E é por estas e outras,
que insisto pelos bons dias e um sorriso breve, nestes lábios enrugados e
quebradiços, do velho de semblante duro e olhos de pedra que sai, carrancudo,
da paisagem que sou.
Marcos Vinicius.
Fotografia: Sumidouro, 22 de
setembro de 2020.
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