Um novo ingrediente foi
acrescentado à profunda crise em que, por fim, nos atolamos. Como se não
bastasse o vendaval de infortúnios que despenca sobre nosso golpeado e abatido
país, corrupção generalizada, desmoralização completa das instituições políticas,
executivos, legislativos e judiciários na lama, oligopólios midiáticos,
ideologizados e vendidos, violência sistêmica, economia à bancarrota e uma completa
falta de perspectiva e esperança em dias melhores, um elemento, até então,
relativamente, pouco presente na sociedade brasileira, é introduzido com força
total. O fundamentalismo. Poderíamos dizer, que comparado a outros países,
ainda que sejamos um povo profundamente religioso, temos um nível de tolerância
tal, que nos permite conviver sem problemas, nos mais diversos ambientes, com
pessoas que professam uma fé diferente da nossa. Não é a religião que
transforma nossas ruas e territórios em campos de batalha. Pois bem. A direita
ultraconservadora, que surfa nas ondas fáceis do dinheiro grande e das vias
telemáticas e digitais, acumulando vitórias uma após a outra, nos mares abertos
de um liberalismo anabolizado, não apenas vê prosperar suas pautas econômicas,
como nada de braçadas em um conservadorismo revigorado, que se espalha,
fantasmagoricamente, entre os robôs invisíveis e as gigantescas redes sociais.
A matriz é, certamente, estadunidense, mas nossas filiais locais, desempenham
bem o papel, dinheiro não lhes falta. Como as conquistas materiais vêm sendo
facilmente efetivadas, resta-lhes agora, os corações e mentes, a sedução
espiritual. A solução encontrada é tão óbvia como explosiva. Insuflar o ódio
contra a liberdade artística e de expressão e semear o caos sanguinolento da
intolerância religiosa. Os manipuladores dos robôs invisíveis, que atuam por
dentro das redes, os formadores de opiniões, os tecnocratas dos golpes, nossos
e alheios, grupelhos barulhentos e fascistas, sob as mais variadas siglas,
empenham-se em explorar a boa fé do brasileiro, canalizar a energia positiva de
suas preces e orações ao ódio em relação ao diferente e ao desconhecido. Assim
nascem as carnificinas históricas. Museus, Exposições, teatros e galerias de
arte, tornaram-se alvos fáceis de ataques e violência. Em Belo Horizonte, desde
que foi aberta a Exposição do artista plástico, Pedro Moraleida, morto há quase
20 anos, grupos religiosos vem se somando a ativistas exaltados do MBL, Direita
Minas, Avança Brasil e uma pequena, mas agressiva legião de bolsominions, e
reivindicando seu fechamento. O dia 10 de Outubro foi dramático e simbólico. Entre
gritos, faixas, cartazes e palavras de ordem, fanfarrões e fanáticos, exigiam,
no coração do Palácio das Artes, a censura. Pela exaltação e fúria dos
manifestantes, não é difícil supor que, uma grande quebradeira poderia se
instalar ali, se não houvesse uma segurança mínima. Não é a primeira vez que
vejo rezas em atos públicos ou de natureza política, nisto não há o que se
estranhar, mas uma oração embalada pelo ódio, ainda não havia visto por aqui. É
o ingrediente novo, tão óbvio como explosivo. Quanta saudade da velha e
inofensiva caretice.
Marcos Vinícius.
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