quinta-feira, 19 de outubro de 2017

Almas degeneradas


Um novo ingrediente foi acrescentado à profunda crise em que, por fim, nos atolamos. Como se não bastasse o vendaval de infortúnios que despenca sobre nosso golpeado e abatido país, corrupção generalizada, desmoralização completa das instituições políticas, executivos, legislativos e judiciários na lama, oligopólios midiáticos, ideologizados e vendidos, violência sistêmica, economia à bancarrota e uma completa falta de perspectiva e esperança em dias melhores, um elemento, até então, relativamente, pouco presente na sociedade brasileira, é introduzido com força total. O fundamentalismo. Poderíamos dizer, que comparado a outros países, ainda que sejamos um povo profundamente religioso, temos um nível de tolerância tal, que nos permite conviver sem problemas, nos mais diversos ambientes, com pessoas que professam uma fé diferente da nossa. Não é a religião que transforma nossas ruas e territórios em campos de batalha. Pois bem. A direita ultraconservadora, que surfa nas ondas fáceis do dinheiro grande e das vias telemáticas e digitais, acumulando vitórias uma após a outra, nos mares abertos de um liberalismo anabolizado, não apenas vê prosperar suas pautas econômicas, como nada de braçadas em um conservadorismo revigorado, que se espalha, fantasmagoricamente, entre os robôs invisíveis e as gigantescas redes sociais. A matriz é, certamente, estadunidense, mas nossas filiais locais, desempenham bem o papel, dinheiro não lhes falta. Como as conquistas materiais vêm sendo facilmente efetivadas, resta-lhes agora, os corações e mentes, a sedução espiritual. A solução encontrada é tão óbvia como explosiva. Insuflar o ódio contra a liberdade artística e de expressão e semear o caos sanguinolento da intolerância religiosa. Os manipuladores dos robôs invisíveis, que atuam por dentro das redes, os formadores de opiniões, os tecnocratas dos golpes, nossos e alheios, grupelhos barulhentos e fascistas, sob as mais variadas siglas, empenham-se em explorar a boa fé do brasileiro, canalizar a energia positiva de suas preces e orações ao ódio em relação ao diferente e ao desconhecido. Assim nascem as carnificinas históricas. Museus, Exposições, teatros e galerias de arte, tornaram-se alvos fáceis de ataques e violência. Em Belo Horizonte, desde que foi aberta a Exposição do artista plástico, Pedro Moraleida, morto há quase 20 anos, grupos religiosos vem se somando a ativistas exaltados do MBL, Direita Minas, Avança Brasil e uma pequena, mas agressiva legião de bolsominions, e reivindicando seu fechamento. O dia 10 de Outubro foi dramático e simbólico. Entre gritos, faixas, cartazes e palavras de ordem, fanfarrões e fanáticos, exigiam, no coração do Palácio das Artes, a censura. Pela exaltação e fúria dos manifestantes, não é difícil supor que, uma grande quebradeira poderia se instalar ali, se não houvesse uma segurança mínima. Não é a primeira vez que vejo rezas em atos públicos ou de natureza política, nisto não há o que se estranhar, mas uma oração embalada pelo ódio, ainda não havia visto por aqui. É o ingrediente novo, tão óbvio como explosivo. Quanta saudade da velha e inofensiva caretice.

Marcos Vinícius.

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